segunda-feira, 11 de março de 2013

O Lenço das Ranhetas



Os fins-de-semana em que os avós nos iam visitar ao Alentejo eram sempre espectaculares. Basicamente eram mais duas pessoas que chegavam para brincar comigo e com a mana. Às dez horas da manhã de sábado, já andávamos excitadíssimas a correr de janela em janela sempre que um carro se aproximava. " Inês, é agora, despacha-te! Eles já chegaram!" Corríamos para o carro para dar muitos beijos e abraços. Traziam-nos sempre uns minúsculos ratinhos de chocolate que tinham um sabor especial. Era um fim-de-semana em cheio: os avós estavam ali para ver os nossos espectáculos de variedades super completos. Cantorias, adivinhas, truques de magia, uma ou outra actuação da Tina Turner, e por aí fora. Um espectáculo que tinha tido público durante a semana, os nossos pais, mas que ao fim-de-semana com os avós era casa cheia, lotação esgotada!

Porém, quando chegávamos a domingo de manhã, depois de ajudarmos o avô a lavar o carro com a mangueira do jardim, eu e a mana entrávamos em stress: era o dia dos avós se irem embora e as despedidas tinham sempre muitas lágrimas, mesmo que no fim-de-semana seguinte voltássemos a estar juntos. 
Houve uma vez que, assim de repente, eu e a mana tivemos uma ideia mirabolante para boicotar a partida dos avós. Como raptar a avó Nini era capaz de dar um bocado nas vistas, fomos à mala dela e tirámos-lhe o lenço das ranhetas. Com um sorriso nervoso, fomos escondê-lo no nosso quarto atrás de um boneco que estava na escrivaninha. Chegara a hora da despedida. Com lágrimas nos olhos, demos um abraço e um beijo, mas havia uma esperança que eles voltassem atrás quando dessem pela falta do lenço. Fomos andar de bicicleta. Passados dez minutos, vimos ao fundo da rua o carro dos avós: "Viva!" O plano tinha dado certo. Agora era só dizer: "Em troca da avó devolvemos o lenço das ranhetas." Estacionaram. Corremos para eles com mais abraços, beijos e gargalhadas. Tínhamos conseguido. "Então, o que vos aconteceu?  Porque voltaram?" Perguntámos e rimos disfarçadamente uma para a outra.  "A vossa avó esqueceu-se dos comprimidos e tivemos que os vir buscar." disse o avô Zé.  "Ahhhhh... tá bem!..." dissemos nós. Passados cinco minutos arrancaram novamente. Desta vez, não ficámos muito tristes, afinal ainda tínhamos um trunfo: o lenço das ranhetas continuava sequestrado, eles ainda podiam voltar, ainda havia esperança!... 

Que saudades desta deliciosa ingenuidade...

1 comentário:

  1. Sónia, também gostei muito do teu espaço, cheio de estórias deliciosas sobre amor, família, cumplicidade e o que nos une às "nossas" pessoas, aquelas mesmo especiais...

    obrigada por partilhares!

    um beijinho

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