segunda-feira, 22 de outubro de 2012

O Funeral do Avô Zé



O funeral do avô Zé foi, provavelmente, o primeiro  a que fui de uma pessoa a quem estava tão emocionalmente ligada. Após o acidente viveu mais um ano entre nós, mas sem memória, eramos presenças para eles, figurantes da sua vida. Era ele que não se lembrava, mas eramos nós que sentiamos não existir. Havia uma esperança de ligação a qualquer momento, um retorno do olhar, mas eram apenas instantes sem profundidade, era um tic-tac, umas vezes está, outras vezes não, e nesse  seu último ano de vida era esse o nosso compasso: tic-tac, tic-tac... Quando estava com ele pedia-lhe muitas vezes um abraço, mas eram abraços desprovidos de emoções, eram encontros terríveis. No dia em que morreu, senti que o voltei a encontrar para lhe dar aquele abraço sincero cheio de emoções, cheio de boas recordações, de idas ao parque, de viagens de comboio. Nesse dia, senti que ele se lembrou de tudo e que estava presente de uma outra forma. Lembro-me de no velório estar sentada a ver amigos, familiares chegarem. Algumas pessoas não conhecia, mas todas elas traziam um bocadinho do meu avô no seu olhar com lágrimas, todas traziam uma peça do puzzle. A memória do meu avô continuava ali, afinal não se tinha perdido. Ele adorava ter pessoas em casa, convívios, almoçaradas e no dia da sua morte conseguiu uma proeza: morreu dia 23 de Dezembro e o funeral foi dia 24, véspera de Natal. Nesse dia, ele conseguiu ter a família toda reunida. Naquele Natal não houve desculpas de vivermos perto ou longe para estarmos juntos, estavamos todos ali, nada era mais importante que aquele abraço. Foi um Natal de emoções fortes.

2 comentários:

  1. Porque as minhas palavras não serão "justas" a tamanha beleza e tanto sentimento expresso nas palavras do teu texto deixo simplesmente um: :)

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